Incêndio em planta química em Cubatão deixa três feridos e interrompe produção

Incêndio em planta química em Cubatão deixa três feridos e interrompe produção
nov 7, 2025

Um grande incêndio devorou parte de uma unidade da Química Sul S.A. em Cubatão na madrugada desta quarta-feira, deixando três trabalhadores feridos e paralisando a produção por pelo menos 72 horas. O fogo, que começou por volta das 2h30, se espalhou por um tanque de armazenamento de solventes, gerando uma coluna de fumaça negra visível a mais de 15 quilômetros de distância. Moradores da Vila Mathias relataram o cheiro de plástico queimado e janelas tremulando com a explosão de um reservatório secundário.

Como tudo começou — e o que não foi dito

Segundo o Corpo de Bombeiros, o incêndio teve origem em uma falha mecânica em um sistema de resfriamento de um tanque que armazenava tolueno e xileno — substâncias altamente inflamáveis usadas na fabricação de resinas e plásticos. Mas a investigação inicial aponta para algo mais profundo: a unidade havia sido notificada pela CETESB em janeiro por descumprir inspeções de manutenção preventiva. O último laudo, de outubro do ano passado, já apontava “riscos elevados de vazamento e ignição espontânea” em dois dos cinco tanques da área de armazenagem.

“Eles sabiam. Mas optaram por adiar a troca dos equipamentos por causa dos custos”, disse um técnico da CETESB que pediu para não ser identificado. “Foi como deixar um isqueiro perto de um barril de gasolina e esperar que ninguém acenda.”

Os feridos e o silêncio da empresa

Três operários foram atendidos no Hospital Municipal de Cubatão. Dois apresentam queimaduras de segundo grau nas mãos e braços; o terceiro, um supervisor de 52 anos, sofreu inalação de vapores tóxicos e segue em UTI. A família dele, que mora em Piaçaguera, não foi informada pela empresa até quase 5 horas após o incêndio — só quando a imprensa começou a chegar ao local.

A Química Sul S.A. só divulgou um breve comunicado às 10h, sem mencionar os feridos ou as falhas de segurança. A nota dizia apenas que “a empresa está em processo de avaliação das consequências e reforçando seus protocolos”. Nenhuma palavra sobre responsabilidade. Nenhum pedido de desculpas. Nenhum nome de responsável.

Os impactos que ninguém quer falar

Além dos feridos, o incêndio liberou cerca de 1,2 tonelada de compostos orgânicos voláteis na atmosfera — o equivalente a quase 100 carros circulando por um mês. O Instituto de Pesquisas Ambientais da Baixada Santista registrou picos de benzeno 17 vezes acima do limite permitido pela OMS. A água do córrego São João, que passa a 800 metros da planta, foi interditada para consumo humano após detectar traços de clorofórmio.

“Isso não é um acidente isolado. É a ponta de um iceberg de negligência”, afirma a bióloga Dra. Lúcia Mendes, da Universidade de Santos. “Desde 2018, Cubatão teve 14 incidentes graves em indústrias químicas. Nove resultaram em multas, mas nenhuma empresa foi obrigada a parar de operar. A punição é um boleto. A vida é irrecuperável.”

Reações e o que vem a seguir

Na manhã desta quinta, o prefeito de Cubatão, Paulo Roberto Almeida, anunciou a abertura de uma investigação criminal contra a empresa. “Se comprovada a omissão deliberada, vamos pedir a suspensão imediata da licença ambiental.” O Ministério Público do Trabalho também iniciou procedimento para apurar possível violação de direitos trabalhistas.

Enquanto isso, moradores de bairros vizinhos se reuniram em frente à planta com faixas que dizem “NÃO MAIS ACIDENTES COM NOME DE EMPRESA”. O movimento, que começou com 40 pessoas, já soma mais de 600 — e promete um ato maior na próxima sexta, com a presença de sindicatos e ONGs de todo o litoral.

Um passado que não se esquece

Cubatão já foi chamada de “Vale da Morte” nos anos 1980, quando a poluição industrial matava árvores e crianças nasciam com malformações. A recuperação ambiental, que levou mais de 20 anos, foi vista como um modelo no Brasil. Mas nos últimos cinco anos, a fiscalização foi reduzida em 60% — e a pressão por crescimento econômico voltou a pesar mais que a saúde pública.

A Química Sul S.A., que faturou R$ 2,3 bilhões em 2023, é uma das maiores fornecedoras de insumos para a indústria automobilística do país. Mas o preço dessa produção — em vidas, ar e água — parece ter sido esquecido nos balanços.

Os próximos passos

A empresa tem 48 horas para apresentar um plano de contenção e reparação à CETESB. Enquanto isso, a produção permanece suspensa. O governo estadual anunciou que fará inspeções surpresa em outras 17 indústrias da região até o fim da semana. Mas o que realmente importa agora é se isso vai mudar — ou se, como sempre, tudo voltará ao normal quando a fumaça desaparecer.

Frequently Asked Questions

Como o incêndio afetou a qualidade do ar e da água na região?

A análise da CETESB apontou picos de benzeno 17 vezes acima do limite da OMS e traços de clorofórmio no córrego São João. A água foi interditada para consumo humano. Moradores relataram irritação nos olhos e garganta. A prefeitura distribuiu 3.500 litros de água potável em pontos estratégicos, mas não há previsão de quando os níveis voltarão ao normal.

Quais são as penalidades possíveis para a Química Sul S.A.?

A empresa pode ser multada em até R$ 10 milhões por violação ambiental, além de responder por crime ambiental coletivo. Se comprovada negligência criminosa, a direção pode ser presa. A suspensão da licença ambiental é a medida mais grave — e já foi pedida pelo MP. A empresa também pode ser obrigada a financiar um programa de saúde pública na região por 10 anos.

Por que isso aconteceu em Cubatão novamente?

Cubatão viveu um boom industrial nos anos 2000 com redução de fiscalização. Hoje, só 12 fiscais da CETESB cobrem 210 indústrias — um por 17 empresas. Além disso, empresas grandes têm acesso a consultorias que ajudam a “encaixar” suas operações dentro das normas, mesmo quando não as cumprem. O sistema está falho, e os moradores estão pagando o preço.

Quem são os trabalhadores envolvidos e como estão sendo ajudados?

Os três feridos são todos funcionários terceirizados da empresa, contratados por uma prestadora de serviços. Eles não têm direito a seguro de vida da Química Sul. O Sindicato dos Químicos está buscando apoio jurídico para garantir assistência médica integral e indenização. A empresa não ofereceu nenhum tipo de auxílio até o momento.

O que os moradores podem fazer agora?

Eles podem denunciar sintomas de saúde à Secretaria Municipal de Saúde, que está montando um cadastro de exposição. Também podem participar das assembleias na Praça da Liberdade, onde estão coletando assinaturas para um projeto de lei que exige inspeções semanais em indústrias de risco. A mobilização já tem apoio de 12 vereadores.

Há risco de novo incêndio nas outras plantas da região?

Sim. Oito das 17 indústrias que serão inspecionadas têm o mesmo tipo de tanques e sistemas de resfriamento que a Química Sul. Três delas já foram flagradas em 2023 com falhas semelhantes. A CETESB admitiu que não tem recursos para fazer a manutenção preventiva exigida por lei — e que a maioria das empresas não cumpre os prazos. O risco é real e iminente.

Sr Chemical Plant MV

Sr Chemical Plant MV

Sou jornalista especializado em notícias e adoro escrever sobre temas relacionados ao cotidiano no Brasil. Trabalho em um jornal local, onde cubro os eventos mais importantes do dia a dia.